Uma massa de ar excepcionalmente quente sobre o Brasil vai se intensificar sobre o Centro do país nesta semana sob um padrão de bloqueio atmosférico. Ao mesmo tempo, ar mais frio vai estar atuando em vários dias sobre a Argentina, gerando um enorme contraste térmico nas latitudes médias do continente.
Uma vez que o Rio Grande do Sul estará na zona de transição entre as duas massas de ar, a quente e a fria, a instabilidade será frequente com expectativa de muita chuva. Ora ar mais frio de Sul avançará para o estado, ora ar mais quente de Norte ingressará, e esta variação constante dia a dia gerará sucessivas áreas de instabilidade com precipitação abundante. O cenário é muito parecido com a da primavera meteorológica do ano passado, durante o auge do El Niño, quando eventos extremos de chuva com enchentes atingiram o Rio Grande do Sul nos meses de setembro, outubro e novembro sob bloqueios atmosféricos associados a potentes ondas de calor no Centro-Oeste e no Sudeste do Brasil.
A chuva que vai cair neste fim de abril e no começo de maio se somará ao que se já se precipitou neste fim de semana e nos últimos dias no Rio Grande do Sul, quando choveu muito e até excessivamente em algumas localidades. Ou seja, serão acumulados muito altos a extremos que se somarão a volumes já elevados ocorridos dias antes. Na rede oficial do Instituto Nacional de Meteorologia, os acumulados apenas nas últimas 72 horas foram de 179 mm em Quaraí, 113 mm em Rio Grande, 110 mm em Caçapava do Sul, 87 mm em São Gabriel, 84 mm em Livramento, 80 mm em Capão do Leão e Vacaria, 78 mm em Campo Bom, 75 mm em Teutônia e 73 mm em Canguçu. Diversas outras estações anotaram mais de 50 mm. Várias cidades sem estações oficiais, mas com monitoramento por outros órgãos e dados particulares, anotaram no período acumulados próximos e acima de 100 mm. Em alguns, a chuva soma 200 mm ou mais em apenas três dias. Na Grande Porto Alegre, somente ontem a maioria das cidades da região anotou chuva entre 50 mm a 80 mm em apenas seis horas.
PROJEÇÕES DE CHUVA DOS MODELOS O cenário de chuva indicado por modelos numéricos para esta semana é por demais preocupante com as simulações indicando acumulados entre 100% e 200% da média de chuva histórica de um mês todo nesta época do ano em apenas sete dias para grande número de localidades gaúchas. Os volumes indicados nas projeções são excessivamente altos a extremos. Os mapas a seguir mostram as projeções de três modelos globais que são utilizados na Meteorologia do mundo inteiro e com histórico de elevado índice de acerto. Embora com discrepâncias na distribuição dos volumes, todos apontam um cenário de chuva excessiva para grande parte do Rio Grande do Sul e Santa Catarina. Os mapas trazem a projeção de chuva para esta semana – apenas sete dias – dos modelos alemão Icon, do Centro Meteorológico Europeu (ECMWF) e ainda da Meteorologia do Canadá (CMC).
Como se observa nos mapas, os modelos indicam volumes acima de 100 mm em grande parte do Rio Grande do Sul e parte de Santa Catarina, mas com acumulados superiores a 200 mm em muitas áreas. Preocupa o indicativo em alguns pontos de volumes apenas nesta semana em algumas áreas de 200 mm a 300 mm, mas com marcas até superiores. RIOS TRANSBORDARÃO E HAVERÁ ENCHENTES Como já choveu muito e os indicativos são de que vai chover muito mais no estado, inevitavelmente haverá cheias de rios e enchentes. A tendência é que várias bacias (rios) devam atingir nesta primeira semana cotas de alerta e inundação no Rio Grande do Sul e em diversas regiões. O mapa abaixo mostra o mapa de risco do Global Flood Awareness System (GloFAS), o modelo hidrológico do Sistema Copernicus da União Europeia que integra dados de previsão de chuva do modelo europeu com hidrológicos. A projeção do GloFAS aponta que a grande maioria dos rios do Rio Grande do Sul tem risco alto (em vermelho) a extremo (púrpura) de inundações nos próximos dez dias.
Moradores do vales, especialmente do Taquari e Caí, duramente castigados pelas enchentes do ano passado, naturalmente indagam se haverá enchente como a de 2023. O risco de cheia dos Rio Taquari e Caí é alto, porém no curto prazo (sete a dez dias) a probabilidade de uma repetição de cheias tão graves como as de setembro ou novembro é remota a baixa. CHUVA EXTREMA TRARÁ INUNDAÇÕES E RISCOS GEOLÓGICOS Diante do cenário que se apresenta de precipitação, apesar de variações em volumes e distribuição da chuva no pacote de modelagem numérica, é certo que haverá impactos para a população e, em alguns municípios, graves. A persistência da chuva por vários dias, além de cheias de rios, trará inundações e alagamentos. Chuva com acumulados tão extremos como se prevê traz ainda riscos geológicos. Será muito alto o risco de deslizamentos de terra em áreas de encostas de morros. Devem ocorrer ainda quedas de barreiras que podem gerar bloqueios parciais ou totais de rodovias estaduais e federais. Algumas estradas, particularmente municipais e rurais, devem se tornar intransitáveis com prováveis trechos e pontilhões cobertos pela água. Com a perspectiva de forte correnteza, trechos alagados devem se terminantemente evitados por motoristas sob perigo de acidentes fatais.
COMO CONSULTAR OS MAPAS Todos os mapas de chuva neste boletim podem ser consultados pelo nosso assinante (assine aqui) na nossa seção de mapas. A plataforma oferece ainda mapas de chuva, geada, temperatura, risco de granizo, vento, umidade, pressão atmosférica, neve, umidade no solo e risco de incêndio e raios, dentre outras variáveis, com atualizações duas a quatro vezes ao dia, de acordo com cada simulação. Na seção de mapas, é possível consultar ainda o nosso modelo WRF de altíssima resolução da MetSul.
FONTE AUTOR Estael Sias Estael Sias, MSc., é autora de MetSul.com e meteorologista formada pela Universidade Federal de Pelotas (UFPEL). Mestre em Meteorologia pela Universidade de São Paulo (USP). Sócia-diretora da MetSul Meteorologia com passagem pelo Grupo RBS, Canal Rural e Defesa Civil de São Paulo.